quinta-feira, 14 de dezembro de 2006

weekend

Sábado, 17h. A semana correu bem, sem grandes complicações. Deixou de chover e o bom tempo ajudou o betão a secar mais depressa o que levou a obra a avançar mais do que previsto. Obviamente foi óptimo para mim e para o meu jantar com o patrão ontem à noite. Quando lhe disse que a minha parte da obra estaria pronta antes do prazo todo ele se transformou em sorrisos - ainda mais.
- Continua assim e em menos de nada estarás bem na vida! - disse-me ele. Olha quem fala! Ele é que está bem da vida, o desgraçado. Com um bruto casarão na quinta da marinha, as melhores obras da capital sempre a cair-lhe nas mãos e uma brasileira daquelas como mulher, o que mais se pode pedir? Ainda por cima, sabe-se lá como, a mulher é-lhe fiel.. Isto há gajos que nasceram com o cu virado pra lua, só pode.
- Não nos podemos contentar com menos. - respondi, um bocado em tom de filme, mas calhou bem - "Então e de negócios? Não se fala? Normalmente só me dão whisky deste calibre quando querem falar de negócios."
Ele riu-se, disse que eu era perspicaz e falou-me do projecto que estava destinado. "Uma coisa grande" - disse - "Com o teu nome numa placa dourada, à entrada!" - vi logo que havia ali qualquer coisa por trás e que precisava de alguém em quem pudesse confiar mesmo que essa confiança fosse paga em moeda.
Ora o projecto: uma "casa das artes" enorme que reunisse os melhores confortos, tanto para artistas como para o público e que se destinava a ter sempre os melhores projectos e apresentações culturais; em pleno coração de Lisboa. A estar pronto em dez meses. E com a planta e decoração baseada numa peça de teatro escrita por Adamastor, cujo nome ele não se lembrava mas tinha qualquer coisa a ver com casa e libertinas. Uma casa de cultura, portanto.
Agora que me lembro disso, é o gajo que escreveu um livro há pouco tempo. Mas que bem, este tótó está bem lançado. Espero que não tenha nada que ver com ele o facto de eu só ter uns meros e incumpríveis dez meses para concluir o projecto, senão prometo que o parto ao meio. Ou em quartos, ainda não decidi.
Quando me vinha embora a brasileira fez-me um sorriso maroto, afinal talvez não seja assim tão fiel quanto rezam as lendas. Não tenho nada contra.
Só mais uma semana em Azeitão e depois posso dormir mais meia hora todos os dias antes de ir para o trabalho. Ah, é claro, e vou passar a ganhar mais.
Enquanto penso nisto, deambulando pelo clube de vídeo, dou de caras com um dvd que suscita a minha atenção: "A docente indecente" - é bom que valha a pena, esta noite recebo a minha amiga rita para uma mega cowboyada daquelas e não quero que ela sinta que o vestido de colegial que lhe ofereci não valeu o investimento. Mais pormenores para breve.

P.S.:Amanhã, como não podia deixar de ser, é tarde de amigos, churrascada e jolas. E noite de futebol!

terça-feira, 12 de dezembro de 2006

O entardecer.

São 15h e no momento em que escrevo este texto, passa precisamente uma semana desde que o meu primeiro romance foi editado, intitula-se "A roda dos tristes", um pouco contra a minha vontade, mas não sei porquê o meu editor conseguiu convencer-me que o nome iria atrair a atenção de mais gente, concordei pois parece-me um homem razoavelmente inteligente e que percebe bastante acerca deste caótico mundo literário. Numa análise geral o livro aborda as rotinas das pessoas e da "tendência para a depressão em espiral na vida urbana", inicialmente pareceu-me um pouco abstracto demais e que as pessoas nao teriam nem tempo, nem paciência para ler os devaneios existenciais de um novato nestas andanças mas, para minha surpresa o livro tem tido boas criticas o que nao é nada mau para um primeiro romance. Para espanto meu, comentam que o livro tem um final feliz, nao sei se será bem um final feliz, mas tendo como pano de fundo a espiral individualistica da vida urbana é fácil de constatar que a maioria das pessoas tenta sempre encontrar algo de bom no meio do caos e da confusão.

Agora que vejo esta obra editada nao posso deixar de pensar que escrever sempre foi o que quis ainda que seja dificil para alguém se lançar neste oficio, mas confesso que o facto de ter escrito alguns textos para teatro com relativo sucesso me deu algum desafogo, financeiramente falando claro, o que me dá liberdade suficiente para não ter que me preocupar em coleccionar empregos e prendendo-me a ocupações desprovidas de qualquer significado, penso naqueles que trabalham em trabalhos que não lhes dizem nada e não me contenho em esboçar um sorriso a pensar na sorte que tenho, e ainda há o bónus de poder trabalhar no sossego da minha casa, na companhia da chavena de café e de um bom CD. É bom ter tudo controlado e saber que a vida corre bem.

Sossego apenas quebrado pelas noites em que recebo a rapaziada para jantaradas e maratonas de cinema, o que me faz lembrar que esta noite os recebo e que ainda tenho a casa para deixar minimamente decente. Se há coisa que detesto fazer é arrumar a casa, definitivamente nao nasci para arrumações e, infelizmente a minha mãe já cá nao está para dar uma ajudinha. No meio das arrumações encontro um álbum de fotografias, começo a folheá-lo e logo me apercebo que se tratam de fotografias de à 10anos atrás quando costumávamos passar as férias numa terreola para os lados de Trás-os-Montes, lembro-me de lá passar belos verões, os jogos de futebol na rua, os banhos nas ribeiras, as bebedeiras na praça da aldeia e as tardes de pancadaria com o pessoal da aldeia vizinha já não me lembro bem porquê...ah! relembro-me agora do nome da aldeia, "Montanelas", e dos trocadilhos que fazíamos, "só lá iamos montar nelas!!", tudo isto na companhia das amizades de verão que com o passar do tempo vão perdendo fulgor fruto do tempo e da distância, bons tempos, boa gente.

Imerso nas lembranças da juventude dou por mim com a casa inteira por arrumar, a nova peça de teatro que tenho entre mãos para acabar, e as compras para o jantar por fazer. São 19h, saio para a rua, uma lufada de ar gelado bate-me na cara e não consigo deixar de pensar o quão é entediante ter que fazer coisas que no fundo nao me suscitam interesse nenhum.

quarta-feira, 6 de dezembro de 2006

o amanhecer

São 06h30. Abro a persiana e lá fora chove. Ainda é de noite. A chuva é macia e desliza pelos telhados e pelas plantas. Só pára na terra. A mim ainda me falta um longo caminho para chegar à terra. À terra, à lama, ao ferro e ao betão. E aos homens. Vamos ver se hoje trabalham bem, não posso com eles nos dias em que decidem trabalhar mal. Não admira que sejam chamados de trolhas..
A rotina da semana recomeça: levantar, abrir as persianas e saltar pra dentro de água. Um banho, fazer a barba, lavar os dentes e um pequeno-almoço de fruta, café e torradas. Meto-me no carro e abalo. Um triste caminho igual aos outros dias todos leva-me até azeitão, até à obra, sempre no meio do trânsito. Sempre o mesmo trânsito, nunca as mesmas caras.
Chego a horas. A maioria do pessoal também. Até não se trabalha mal hoje, uns pequenos problemas com um servente de pedreiro estúpido que quase derrubou uma parede com uma máquina antes do almoço mas nada de mais. Almocei por ali com o arquitecto da obra. Um gajo porreiro, talvez fosse gajo para ir sair e beber uns copos, não fosse ter que estar sempre às ordens da mulher e dos filhos.
O dia hoje acabou bem: fui convidado para ir jantar a casa do meu patrão na sexta. Cheira-me que vou subir na carreira. Esperemos que signifique mais dinheiro com o mesmo trabalho. Não sei onde vou arranjar tempo para ter mais trabalho e não estou disposto a cortar nos meus fins de semana.
De caminho para casa falam na rádio de um livro novo: "A roda dos tristes", de um tal Adamastor. Ele é que é o verdadeiro triste - com um nome destes, os pais não deviam gostar muito dele.. A crítica é boa, parece que já há algum tempo que se dedica a escrever teatro e que agora passou para a prosa. O livro fala das rotinas das pessoas e da "tendência para a depressão em espiral na vida urbana" - um verdadeiro buraco sem fundo, diga-se. Mas ao que parece tem final feliz.. Pior ainda! Esta conversa é filosófica demais para mim. Na volta o gajo é rabo. Só me faltava mais esta: estar preso no trânsito e a ouvir falar de pseudo-intelectualoides. Muda, mete música.

Prólogo

O relógio marca 7h da manhã, daqui a 30 minutos começa o meu dia, penso. O dia nasce triste, anunciando a chuva que aí vem, mas também antevendo o caos, a confusão e perda de identidade resultante da vida na cidade.
Vinte e sete anos passaram desde que aqui nasci e cresci, em Lisboa. Baptizado Adamastor, em homenagem ao temível e imaginário monstro daquela que é incontestavelmente a maior história de ficção alguma vez escrita neste país à beira mar plantado, os Lusíadas. Por estes dias ainda vivo na mesma casa que pertenceu a meus pais, cansados da vida urbana decidiram mudar de ares e habitam numa casa algures no litoral alentejano. Nos dias que correm dedico-me à escrita, ofício que escolhi para perpetuar o meu nome na cultura literária deste País e claro, em busca do romance que me imortalizará literariamente, apesar dos meus pais terem desejado que enveredasse por uma carreira no ramo da engenharia civil, decidi ignorá-los argumentando que a engenharia civil não era para mim, por achar que a grande maioria é incompetente e que provocam inúmeros acidentes.
Confesso que a carreira de escritor vai curta, apenas tendo escrito alguns textos para peças de teatro com relativo sucesso, mas a partir deste dia tudo vai mudar, porque é hoje que é publicada a minha primeira obra literária, não será propriamente uma "masterpiece" mas dêm-me tempo, como dizem os antigos, "a paciência é uma virtude" e tudo na vida tem recompensa. Ok, quase tudo, mas no meu caso gosto de pensar que sim, até porque tudo depende de quem lê.
São 7h30, o relógio toca. O dia amanhece triste e chuvoso, anunciando o que está para vir, o caos, a confusão, o desentendimento, a constante individualização do ser face à vida em sociedade, enfim, a vida na grande cidade. Pergunto-me quando irão mudar as coisas, gostava de contribuir para essa mudança.
O relógio marca 8h30 e enquanto ponho os auscultadores, mergulhando na minha individualidade, esqueço tudo o que pensei e preparo-me para as vicissitudes da cidade.


segunda-feira, 4 de dezembro de 2006

Génesis..

No início era o verbo. Passado alguns anos nasci eu - Jafo Manuel Dias - filho de agricultores modestos da terrinha. Nunca percebi o porquê deste nome posto pelos meus pais. Presumo que foi fruto da monumental besana que o meu pai apanhou no dia em que nasci e da sua têndencia para contar piadas quando estava ébrio. Qual é a piada? Cada vez que me perguntam o nome eu digo: "O meu nome é Jafo Manuel Dias, mas todos os meus amigos me chamam de Jafo Dias". Não que realmente tenha muita piada quando se está sóbrio mas acredito que o meu pai tenha achado graça na euforia do momento. Além do mais é sempre um bom pretexto para quebrar o gelo.
Acabei por ser um estudante bom, tirei o meu cursinho de engenheiro na capital com muito esforço e consegui abandonar a triste terra. Também nunca gostei muito da merda da terra. Montanelas. Mas quem é que vive em Montanelas? Ainda por cima não eramos mais de 400 pessoas, todos se conheciam e andávamos sempre à porrada com o pessoal das terras vizinhas porque diziam que só lá iam "montar nelas"... como diria um sábio espanhol: "Qué vida más triste!" mas pronto. Ao menos eu tinha consciência da triste vida que ali se levava e decidi sair. Para tal também contribuiu a morte dos meus pais devido à queda do telhado lá de casa. Mas não falemos de coisas tristes. (A morte dos pais de um engenheiro civil, cujo ramo de especialidade até é o de estruturas, devido à queda do telhado..nem sei que diga ou que sinta..)
Bom, mas isso não vem ao caso, agora a minha vida é outra: vivo em oeiras, sozinho mas num loft impecável, condomínio privado, umas vizinhas bem boas e muitas visitas dos amigos aos fins de semana! Amanhã começa uma nova semana, tou todo rebentado - neste fim de semana inteiro devo ter dormido só 3 horas - como é bela a vida aos 30! Vou ter de me levantar às 06h30 pois estou a supervisionar uma obra na margem sul, em Azeitão. Acho que por hoje fico por aqui..