quarta-feira, 6 de dezembro de 2006

o amanhecer

São 06h30. Abro a persiana e lá fora chove. Ainda é de noite. A chuva é macia e desliza pelos telhados e pelas plantas. Só pára na terra. A mim ainda me falta um longo caminho para chegar à terra. À terra, à lama, ao ferro e ao betão. E aos homens. Vamos ver se hoje trabalham bem, não posso com eles nos dias em que decidem trabalhar mal. Não admira que sejam chamados de trolhas..
A rotina da semana recomeça: levantar, abrir as persianas e saltar pra dentro de água. Um banho, fazer a barba, lavar os dentes e um pequeno-almoço de fruta, café e torradas. Meto-me no carro e abalo. Um triste caminho igual aos outros dias todos leva-me até azeitão, até à obra, sempre no meio do trânsito. Sempre o mesmo trânsito, nunca as mesmas caras.
Chego a horas. A maioria do pessoal também. Até não se trabalha mal hoje, uns pequenos problemas com um servente de pedreiro estúpido que quase derrubou uma parede com uma máquina antes do almoço mas nada de mais. Almocei por ali com o arquitecto da obra. Um gajo porreiro, talvez fosse gajo para ir sair e beber uns copos, não fosse ter que estar sempre às ordens da mulher e dos filhos.
O dia hoje acabou bem: fui convidado para ir jantar a casa do meu patrão na sexta. Cheira-me que vou subir na carreira. Esperemos que signifique mais dinheiro com o mesmo trabalho. Não sei onde vou arranjar tempo para ter mais trabalho e não estou disposto a cortar nos meus fins de semana.
De caminho para casa falam na rádio de um livro novo: "A roda dos tristes", de um tal Adamastor. Ele é que é o verdadeiro triste - com um nome destes, os pais não deviam gostar muito dele.. A crítica é boa, parece que já há algum tempo que se dedica a escrever teatro e que agora passou para a prosa. O livro fala das rotinas das pessoas e da "tendência para a depressão em espiral na vida urbana" - um verdadeiro buraco sem fundo, diga-se. Mas ao que parece tem final feliz.. Pior ainda! Esta conversa é filosófica demais para mim. Na volta o gajo é rabo. Só me faltava mais esta: estar preso no trânsito e a ouvir falar de pseudo-intelectualoides. Muda, mete música.